24/09/2014

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                 R E J E I Ç Ã O   À   P O L Í T I C A
Por: Gileno Guanabara, sócio efetivo do IHGRN

            Sílvio Pons, historiador italiano, professor da Universidade de Roma, veio ao Brasil e lançou seu livro A Revolução global: história do comunismo internacional (1917/1991). Graduado pela Universidade de Florença, dedicou-se ao estudo da política externa da então União Soviética, motivo maior de suas preocupações.

            O autor expõe que foram as guerras o leit motiv das revoluções comunistas do século passado: a Revolução Russa (1917), e a Revolução Chinesa (1949), decorrência da Primeira e da Segunda Guerra Mundial, respectivamente. Em comparação, o avanço comunista na Indochina, ou a crise do petróleo nos anos 1970, não corresponderam à eclosão de processo revolucionário algum. Ainda antes, na crise de 1929 - o New Deal - o estado americano se valeu das teorias econômicas de Johan M. Keyne, fez intervencionismo, através de verbas públicas combateu o desemprego e fomentou os postulados da economia de mercado. Assegura o professor que as crises do capitalismo não geraram, obrigatoriamente por consequência, os conflitos mundiais. Como se numa figuração jamais esquecida, porém, as relações internacionais dos comunistas ficaram definidas pelas duas grandes guerras, para quem a ideologização da História, vista a partir da era de Stalin, tornou-a um fato violento e, nesse mesmo entendimento, o capitalismo como modelo econômico a superar. Como base na violência dos conflitos e, inclusive, das revoluções, justificava-se a violência histórica. O fascismo tivera por projeto conquista e expansão territoriais.

            Só com a forma necessariamente violenta da prática política haver-se-ia de vencer os tempos duros e assim se alcançar o paraíso. Nada mais justificável do que uma guerra geral mundial e, ao cabo de que, se implantasse a alternativa ao capitalismo, ou seja, a preparação dolorosa com a guerra inevitável. Daí a necessidade do sacrifício como fundamento do autoritarismo.

            Nas duas últimas décadas do século passado, a URSS não viveu uma recessão econômica, mas sofreu uma estagnação, tal como hoje sofre a União Europeia, sem que haja perigo de a Europa ser alvo de uma revolução. Basta ler os periódicos que noticiam a evolução da crise nos países da Zona do Euro: Portugal, Grécia, Itália e Espanha, as propostas assumidas para conter a sangria da crise. Entretanto, a crise na URSS se fundamentou na desagregação provocada pelas contradições entre o Estado Soviético, os demais estados comunistas e o partido. Ocorreu um choque entre o modelo de revolução mundial, ocorrência necessária para que se mudasse o mundo para melhor e os interesses do Estado, em si.

            A ruptura da China com a URSS, exposta a partir do ano de 1960, fez ruir a unidade do movimento comunista mundial, tornando vazio o projeto internacionalista como alternativa ao capitalismo. A força ideológica do projeto global comunista pela via violenta da revolução ofuscou a realidade que insistia em aparecer, mas não interessava à liderança soviética identificar. Veja-se o papel inovador do Partido Comunista Italiano.

            Os avanços e percalços do comunismo chinês podem ser explicados pela via da revolução continuada, do partido e da mudança de sua direção. A partir de 1980, a China abandonou o projeto exclusivo comunista e acolheu o autoritarismo de mercado, com raro pragmatismo nas suas relações. A China repudiou as formulações do comunismo do século findo e aplicou práticas realistas para com a atual economia.

            De forma seletiva, a Rússia imperial – não mais a URSS – permaneceu interferindo nas regiões que lhe fazem fronteira, com interesses definidos, por exemplo, na Síria, diferente de quando está em foco a questão palestina. Ou sua importância energética, fornecedora de gás à União Europeia, através da Ucrânia, onde arregimenta seus saudosos guerreiros, do tempo em que fora parte do bloco soviético. Sublimando seus conflitos para com a China, a Rússia preserva seus interesses sem aparentemente confrontar-se com o poder americano. Por isso, demonstra leniência para com os governos ocidentais, face as peripécias do Irã, da Coreia do Norte e seu partido.

            Os Estados Unidos, porta-voz do liberalismo econômico, no afã demagógico de capitalizar o enfrentamento ao fundamentalismo islâmico, interveem militarmente em condições adversas. Dadas as intervenções duvidosas, que geram ondas de ódio e repulsa, alongam a crise econômica interna, acirrando a divergência entre os democratas e os republicanos. Além do mais, a intervenção no Oriente Médio provoca gastos orçamentários perdulários, com reflexo na economia. Já a Inglaterra, diante da onda de separatismo, vê com preocupação os escoceses aptos a se manifestar pró independência. Por fim, a União Europeia em crise de solidariedade, face a pujança da economia alemã. Nem o banco central europeu, nem a moeda única garantem a unidade, como ocorreu anteriormente em outros conflitos, dada a  presença dos estados mais fragilizados.

A queda do muro de Berlim simbolizou o fim da experiência comunista internacionalista e, com efeito, repercutiu com força na fé das transformações políticas, qualquer que seja o viés ideológico. Afinal, gerações se frustraram com o fim da grandiosa experiência da revolução global que deu seus últimos suspiros com a Glasnost e a Perestróica. É de se esperar a formulação de nova política global, em formas ainda não explicitadas, tal como a que sinalizaram as revoltas do Oriente Médio, a insurgência popular contra a superficial divisão geoeconômica dos califados do petróleo, o poder político estabelecido de fora para dentro após a Segunda Guerra Mundial, a rejeição ao expansionismo do Estado de Israel e o sectarismo religioso na política. Ou até se reconhecer o vertiginoso crescimento da saúde chinesa.
A América Latina permanece no ciclo alternativo de crises econômicas e políticas, de períodos autoritários, de caudilhos desde Samora a Fulgêncio Batista, dos tempos de Perón às tentações de Getúlio. O autoritarismo ronda intermitente a vala comum das republiquetas abaixo do Equador. O temor é a rejeição à política, a partir do que não encontraremos solução para os problemas entre as nações ou as pessoas.    

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