20/12/2014

A primeira vinda a Natal

Elísio Augusto de Medeiros e Silva (in memoriam) 

Era a primeira vez que o menino vinha à Capital. Viajava em companhia do seu pai, e ficariam hospedados na casa do tio Clementino.
Na chegada, uma das coisas que mais o impressionou foram os bondes elétricos que circulavam em Natal. Na sua pequena Cidade Interiorana, os meios de transporte eram os animais de montaria e as carroças de tração animal. Até os automóveis somente apareciam ocasionalmente.
Ficou maravilhado com os bondes e o desejo de andar em um deles logo se manifestou. Qual seria a sensação?
Da porta da casa do seu tio, na Av. Junqueira Aires, ficava horas observando os bondes, conduzidos pelos motorneiros, vindos da Ribeira para a Cidade Alta, com alguns passageiros mais afoitos pendurados em seus estribos.
Notou que em cada um dos bondes havia uma luzinha, sempre acesa, na frente: roxa, vermelha, branca ou azul.
A casa também apresentava várias novidades aos seus olhos infantis – luz elétrica, água encanada e telefone.
Quando acendia uma lâmpada, ficava olhando, encantado, aquele bulbo de vidro, brilhando e clareando tudo ao redor. Nem parecia a lamparina de sua casa.
Foi na casa do tio que provou, pela primeira vez, a água gelada. De início, parecia que queimava a sua boca, mas logo se acostumou.
Numa tarde, foi levado a um passeio na Cidade Baixa, pelas ruas transversais à Dr. Barata, que mostrava inúmeras coisas que nunca imaginara existir. Antes, passou pela Estação Ferroviária, onde o trem resfolegava e soltava fumaça. Na rua, os homens de chapéu e ternos, e as senhoras muito bem-vestidas, passeavam pelas ruas, sem pressa.
– É o footing, disse-lhe tio Clementino.
Passou a tarde brincando na rua, atônito com tantas novidades.
No dia seguinte, pela manhã, seu tio levou-os até a Praia de Areia Preta. Foram de bonde até a Avenida Beira-Mar. Um passeio inesquecível!
Nunca iria esquecer o primeiro contato que teve com o mar. Era enorme e não pode conter o espanto, exclamando, com os olhos arregalados: Que açudão! Todos ao seu redor riram.
Naquele dia, provou pela primeira vez a água do mar. Como era salgada! Não entrou na água, limitou-se a cavar um poçinho, na areia branca da praia.
De volta à casa, conheceu cedinho da noite outras crianças, mais ou menos de sua idade, com as quais brincou na calçada até às 21:00 hs, hora de menino dormir.
No outro dia, pela manhã, todos desceram até o Rio Potengi, para admirar alguns vapores da Lloyde que estavam atracados, esperando suas cargas de algodão. Coincidentemente, assistiu à chegada de um hidroavião, procedente da Europa. Nunca vira nada igual.
À tarde, seu tio colocou na vitrola “Pana Trope” alguns discos de Carlos Gardel. “Fumando espero” e “Se acabaron los otários”, que eram os tangos de sua predileção, foram repetidos várias vezes. Às vezes, até ensaiava alguns passos desajeitados pela sala.

De volta a sua terra, levava registradas na memória as coisas fantásticas: bonde, geladeira, telefone, navio, hidroavião, cujas lembranças demorariam a se apagar.

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